Pesquisa revela perfil socioeconômico da população indígena refugiada e migrante em Roraima

Possibilitar o desenho de novas estratégias por parte dos atores da Operação Acolhida, com foco em soluções duradouras junto à população indígena refugiada e migrante, que reside em dois abrigos em Roraima, sob a gestão da Fraternidade – Federação Humanitária Internacional (FFHI) com apoio do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).

Este foi o objetivo da pesquisa quali-quantitativa realizada durante os meses de novembro e dezembro de 2020, considerando um universo de 382 pessoas acima dos 16 anos, sendo que 70% destas residem no Abrigo Pintolândia, em Boa Vista, e 92% no Abrigo Janokoida, em Pacaraima.

A maior parte dos entrevistados, correspondendo a 90%, pertence à etnia Warao, 5% à etnia E’ñepa, e outros 5% declararam não pertencer a nenhuma das etnias citadas, sendo distribuídos entre criollos e mestiços, e um deles, pertencente à etnia Akawuaio.

Perfil socioeconômico da população indígena refugiada e migrante em Roraima

A coleta de dados foi feita por meio de um questionário com 31 perguntas através da plataforma KoBoToolBox, “de modo sensível, levando-se em conta as especificidades culturais do público e a origem do entrevistado”, ressalta a equipe de pesquisadores.  

As entrevistas, que tiveram lugar na residência do público pesquisado, foram realizadas na língua espanhola e facilitadas por mediadores, nos casos em que os entrevistados não tinham conhecimento pleno do idioma. Nas entrevistas com membros da etnia E’ñepa, um antropólogo atuou como facilitador na mediação das informações.

Com este diagnóstico, foi possível conhecer o perfil da população acima dos 16 anos, tais como: experiências laborais, acesso à renda, contextos de educação e capacitação para Meios de Vida.

Perfil dos entrevistados

Perfil socioeconômico da população indígena refugiada e migrante em Roraima

Quanto ao gênero, a pesquisa revelou-se equilibrada. Do total de entrevistados, em um universo de 382 pessoas, 51% são do gênero feminino, enquanto que 49% são do masculino.

A maior parte dos entrevistados tem entre os 16 e os 30 anos, o que corresponde a 54% da população.

Sobre a questão linguística, 96% afirmaram falar espanhol, 87% declararam ser falantes de Warao, enquanto que apenas 20% afirmaram falar português.

No quesito educação, 18% declararam não saber ler, nem escrever. Já 17%, informaram ter cursado até o 6º ano, que corresponde aos anos iniciais do ensino fundamental no Brasil (sendo nove anos ao todo). Ainda 14% dos entrevistados, afirmaram ter concluído o bachiller, que corresponde ao ensino médio no Brasil, e apenas 2% declararam ter formação técnica.

Entre os entrevistados, 85% afirmaram que não fizeram nenhum curso no Brasil. Somente uma minoria, composta pelos demais 15% dos diagnosticados, responderam ter participado de algum curso em território brasileiro.

Em relação ao trabalho, 51% dos pesquisados responderam não ter tido nenhuma experiência de trabalho no Brasil, enquanto que 49% deles afirmaram ter alguma experiência.

Quanto à expectativa sobre os locais de trabalho, 57% expressaram vontade de trabalhar na cidade, já os demais 43% preferem o trabalho rural.

Análise de dados: uma síntese da equipe coordenadora da pesquisa

Os dados apresentados demonstram a necessidade de um desenho específico de estratégias de meios de vida entre as agências e as organizações, baseado em cursos básicos, como o curso de português para povos indígenas, de cursos profissionalizantes com foco em geração de renda, do reconhecimento das capacidades já adquiridas na Venezuela, e de ações que, nessas estratégias, contemplem tanto perfis rurais quanto urbanos.

O levantamento apresenta como resultado a necessidade de ofertar serviços básicos para estas comunidades, como mecanismo de autonomia e apoio comunitário, uma vez que o acesso aos serviços básicos e à renda segura são os primeiros passos para sairem dos abrigos.

Considerando os grupos pesquisados, compostos na sua maioria pela população indígena Warao e Eñepa, buscou-se ter uma compreensão mais ampla sobre a diversidade dos perfis, com reflexões sobre as questões étnicas, as diferenças entre os grupos, considerando idiomas, lideranças e perfis diferentes, respeitando as suas particularidades, bem como as suas perspectivas e experiências prévias.

Ao longo da análise de dados, foram apresentados alguns caminhos e alternativas viáveis, para que se possam valer da sua formação e experiência de trabalho prévias na Venezuela, com vistas a encontrar melhores oportunidades de emprego e melhorias de vida no Brasil.

Como forma de participação destes grupos em programas sociais, a sugestão foi a realização de mutirões, para auxiliá-los tanto na  documentação, como no acesso a esses benefícios, e assim terão mais autonomia financeira dentro dos abrigos, enquanto buscam uma fonte de renda mais estável.

No tocante ao tema educação, o diagnóstico mostrou que a maioria dos Warao e E’ñepa têm interesse em continuar os estudos no Brasil, seja em áreas técnicas, seja em cursos universitários. Embora haja um número significativo de pessoas com escolaridade completa, que vai do bachiller até a graduação, passando por cursos profissionalizantes, a falta de certificação que comprove essa escolaridade, passa a ser um obstáculo a ser resolvido, bem como a validação de cursos superiores no Brasil, para aqueles que já possuem certificados de conclusão emitidos na Venezuela, e desejam ingressar no mercado de trabalho.